"O grande responsável pela situação de desequilíbrio ambiental que se vive no planeta é o Homem. É o único animal existente à face da Terra capaz de destruir o que a natureza levou milhões de anos a construir"





terça-feira, 14 de julho de 2015

Epilobium tetragonum L.


Nome comum: erva-bonita

Epilobium tetragonum é uma erva perene cuja forma biológica é designada por hemicriptófito. Quer isto dizer que, embora pareça secar e morrer após a frutificação, a planta apenas perde as partes aéreas, dado que as gemas de renovo subsistem ao nível do solo durante a estação desfavorável. As gemas de renovo são estruturas sensíveis, a partir das quais surgirão os novos rebentos, logo que se verifiquem as condições climatéricas adequadas. 
Folhas em roseta protegem as gemas de renovo de E.tetragonum durante a estação desfavorável.

Entretanto, as gemas de renovo permanecem protegidas por pequenas folhas de forma elíptica que nascem no final do verão ou outono e se dispõem em roseta, desaparecendo posteriormente. 
Apesar de finos, os caules de Epilodium tetragonum são robustos, eretos, cobertos de pelos curtos (não glandulares) e podem ser solitários, ramificados lateralmente ou a partir da base. 
Os caules são cilíndricos mas apresentam 2 a 4 linhas salientes no sentido longitudinal que lhe dão o aspeto quadrangular que justifica o epíteto específico de tetragonum.
As folhas caulinares dispõem-se de forma oposta, excetuando por vezes, as da parte superior da planta. São folhas simples e quanto à forma são oblongo-lanceoladas. As margens são serradas e a nervação é muito marcada. Geralmente são glabras exceto as superiores que apresentam alguns pelos na nervura central da página inferior. 
As folhas praticamente não têm pecíolo e são decurrentes, isto é, o limbo da folha cresce parcialmente aderente ao caule, prolongando-se abaixo do nível de inserção.
As flores, bracteadas, reúnem-se em inflorescências do tipo racemo ou cacho, em que o pedúnculo da inflorescência se ramifica repetidamente e os pedicelos das flores se inserem no caule a diferentes níveis , atingindo diferentes alturas. 
0s pedicelos não ultrapassam os 3 cm mas parecem muito mais compridos pois ligam-se à flor pela base do ovário, o qual é muito longo e estreito, formando um tubo.
Os botões florais apresentam forma ovóide, com a ponta distintamente cónica. 
As 4 sépalas que formam o cálice estão cobertas de pelos e são verdes quando jovens, tornando-se depois avermelhadas nas margens.
As 4 pétalas, de um tom rosa-purpura, são ligeiramente maiores que as sépalas e apresentam um pequeno entalhe a meio do ápice.
Nesta foto podem ver-se o estigma, tem forma arredondada (semelhante a uma cotonete) e os estames, estes carregados de pólen esbranquiçado.
As flores são denominadas perfeitas ou hermafroditas pois possuem órgãos masculinos e femininos funcionais. O androceu apresenta 8 estames desiguais sendo 4 maiores que os restantes. As anteras são esbranquiçadas, assim como os grãos de pólen.

O estilete, vindo do ovário, é ligeiramente maior que os estames mais compridos e termina num estigma claviforme ou seja, em forma de clava — uma estrutura alongada e cilíndrica, dilatada da base para o ápice, o qual é arredondado.

As setas indicam os ovários estreitos e alongados onde se formarão as sementes.
O ovário é muito estreito e comprido e é ínfero ou seja, posiciona-se abaixo das sépalas, pétalas e estames cujas bases se unem, formando um tubo designado por hipanto. 

Frutos verdes dentro dos ovários
Depois da fecundação as peças florais caiem e o ovário engrossa, transformando-se num fruto valvar alongado, coberto de pelos curtos não glandulares e com 4 nervuras longitudinais salientes, tal como acontece nos caules. 
Fruto verde em que se podem ver as sementes verdes no seu interior
Quando maduras estas cápsulas secam e ao perderem humidade curvam-se e são forçadas a abrir, separando-se em 4 arcos graciosos, expondo as sementes envoltas em longos tufos de pelos sedosos.
Frutos e sementes maduras
As sementes, de forma obovóide, vão-se soltando aos poucos, sobretudo por ação do vento.

Epilobium tetragonum cresce sobretudo em lugares moderadamente húmidos, em solos enriquecidos e em pleno sol, como margens dos caminhos, orla de campos cultivados, jardins e estufas ou viveiros assumindo, por vezes, algum gosto pelos espaços ruderalizados.

Epilodium tetragonum L. subdivide-se em dois taxa, ambos presentes em Portugal:
- subsp. tournefortii e subsp. tetragonum

Basicamente a subsp. tournefortii tem caules mais robustos, as raízes mais grossas e as sementes maiores. As peças florais são também maiores. De resto, as características acima descritas são válidas para ambas as subespécies. Vejamos agora os carateres que as diferenciam e ajudam a identificar.

Subsp. tournefortii:
- Caules: 20 a 110 cm de altura e 2 a 10 mm de diâmetro.
- Pedicelos das flores: 1,5 a 3 cm de comprimento, na frutificação
- Folhas: 1,5 a 7 cm de comprimento e 0,3 a 1,8 cm de largura
- Botões florais: até 8 mm de comprimento
- Anteras: de 1,5 a 2,4 mm
- Pétalas: de 6 a 11 mm
- Cálice: de 6 a 10 mm, incluindo o tubo do hipanto
- Frutos: de 5,5 a 8,5 cm
- Sementes: de 1 a 1,3 mm

As características da flor, nomeadamente o tamanho das anteras e a posição destas em relação ao estigma parecem dar a indicação que a reprodução sexual se realiza através de polinização cruzada, ao contrário da subsp. tetragonum que, de modo geral,  é fecundada através de autopolinização (como acontece, aliás, com a maioria das espécies do mesmo género, Epilobium).
A subsp. tournefortii tem distribuição mediterrânica e ocorre, de forma relativamente dispersa, em  Portugal continental (oeste e sul, mais rara no norte), sul de Espanha,  sul de França, Córsega, Sardenha, Itália, Malta, Turquia, Líbano e Palestina.

Subsp. tetragonum:
É uma planta autóctone da Europa, sudoeste asiático e norte de África. Encontra-se naturalizada na África do sul, América do norte, Chile, Nova Zelândia e Austrália.
No que diz respeito a Portugal, é autóctone do continente e Madeira e naturalizada nos Açores. As fontes de informação sobre a distribuição em Portugal são escassas mas a Flora Iberica coloca-a na Beira Baixa, Beira Alta, Beira Litoral, Estremadura e Trás-os-Montes. Tanto quanto me foi possível apurar, embora não sendo uma planta rara também não é das mais abundantes. Apesar de tudo esta subespécie parece ser mais abundante que a subsp. tournefortii.
A subsp. tetragonum é, em geral, mais ramificado e mais denso que a outra subspécie. A produção de flores é bastante mais abundante resultando numa farta acumulação de longas cápsulas verticais.
- Caules: 20 a 90 cm de altura e 1 a 6 mm de diâmetro
- Folhas: 1,5 a 6 cm de comprimento e 0,3 a 0,8 cm de largura
- Pedicelos das flores: 1 a 2,5 cm de comprimento, durante a frutificação
- Botões florais: ate 5 mm
- Cálice: de 4 a 6 mm
- Pétalas: de 3 a 5,5 mm
- Anteras: 0,7 a 1,1 mm
- Frutos: de 6 a 9,5 cm
- Sementes: de 0,8 a 1 mm
Embora ocasionalmente visitada por insetos, nota-se na subsp. tetragonum, um elevado grau de autogamia, circunstância em que as flores são fecundadas pelo seu próprio pólen. Esta situação é comum em quase todas as espécies Epilobium e resulta do facto de as anteras dos estames superiores libertarem o pólen na fase em que o estigma começa a ficar recetivo, facilitando o acesso do pólen ao estigma, quer por ação do vento ou da gravidade. Tendo em conta o diminuto espaço entre estes órgãos também os insetos ao roçarem na base dos estames, favorecem o contato entre anteras e estigma.

Alguns cientistas consideram ainda a existência de uma terceira subespécie: Epilobium tetragonum lamyi (F.W.Schultz)Nyman.
Contudo este taxon tem sido objeto de ampla discussão, havendo falta de convergência na interpretação das características que lhe são atribuídas. Entretanto, os autores que se dedicam à investigação em Portugal e Espanha chegaram à conclusão que os registos que assinalam a presença de E. Lamyi na Península Ibérica, são erróneos.
Segundo o botânico espanhol Gonzalo Nieto Feliner, nas suas Notes on Epilobium (Onagraceae) from the western Mediterranean, assegura que “as características invocadas por diferentes autores para diagnosticarem E. lamyi não demonstram uma clara correlação com os numerosos espécimes examinados na Península Ibérica. Por outro lado, não existe consenso no que se refere as características deste taxon que o possam distinguir de E.tetragonum”.
Também com base nos estudos deste cientista, a Flora Iberica publicou as seguintes observações:
“Entre o material peninsular não vimos nada que claramente se refira à subsp. Lamyi (F.W. Schultz) Nyman, Consp.Fl.Eur.: 247 (1879).  A validade deste taxon é apoiada por muitos autores, mas há pouco consenso quanto aos carateres diagnóstico do mesmo. A razão, no que diz respeito à Península, é que o que geralmente é identificado como subsp. lamyi ou E. lamyi não é outra coisa senão  Epilobium obscurum. O tipo de E. lamyi — de Limoges, França — parece poder ser incluído em E. tetragonum, embora mostre algumas características mais próprias de E.obscurum, nomeadamente a forma, margem e base das folhas, o comprimento do fruto ou, em alguns casos, a presença de algum pelo glandular no tubo do cálice. Estas características são, aparentemente, a causa de tanta confusão”.
[Cf. Nieto Feliner in Anales Jard. Bot. Madrid 54: 255-264 (1996)].

Epilobium tetragonum pertence ao género Epilobium. Este inclui cerca de 170 espécies  herbáceas que se distribuem pela maioria dos climas árticos, temperados e subtropicais. Segundo o portal Flora-on são 8 as espécies deste género presentes em Portugal. Confira AQUI
O nome Epilobium significa literalmente “em cima da cápsula” e refere-se à posição da corola no topo do longo ovário. O nome deriva do grego “epi”=sobre ou em cima de + “lobos”= cápsula ou vagem.
Epilobium é um género notável pela sua diversidade morfológica, ecológica e citológica, sendo alvo de múltiplos estudos taxonómicos e evolutivos. Sob o ponto de vista taxonómico é um grupo muito difícil de identificar, não só porque muitas das espécies são semelhantes, mas sobretudo devido à tendência que têm para hibridar com outras espécies do mesmo género que existam nas proximidades. De notar que estes híbridos são maioritariamente férteis (capazes de produzir sementes viáveis) pois as espécies Epilobium são compatíveis entre si, o que geralmente não acontece noutros géneros.

Certas espécies de Epilobium, nomeadamente Epilobium angustifolium, E. hirsutum, E. palustre, E. tetragonum e E. rosmarinifolium têm sido usadas desde há séculos como alimento (os pequenos e tenros rebentos laterais) e em medicina tradicional. São-lhe atribuídas propriedades anti-inflamatórias, analgésicas, antioxidantes, além de atividades antiproliferativa e antimicrobiana. Os principais constituintes — os nossos já conhecidos metabólitos secundários — são os polifenóis, entre os quais ácidos fenólicos, flavonóides e taninos (oenothein A e principalmente B).
Os extratos de Epilobium podem ser usados internamente sob a forma de infusão. Todas as partes da planta podem ser usadas desde a raiz e caules até às folhas e flores.
O tratamento visa problemas da próstata, desordens gastrointestinais e da bexiga, infeções urinárias e incontinência urinária, aftas e outras afeções da mucosa bucal.
Externamente usa-se para tratar pequenas feridas da pele, acne, eczema, rosácea. Hoje em dia é muitas vezes adicionada a cosméticos, champôs e produtos de limpeza da pele. Certos produtos terapêuticos para tratamento das afeções da pele também incluem extratos de Epilopium.
Nota:
Epilobium interfere com a hormona progesterona pelo que deve ser evitada durante a gravidez, em caso de uso de pílulas anticoncepcionais ou terapia hormonal de substituição.

O género Epilobium é o maior dos 17 géneros que constituem a família Onagraceae cujo nome se baseia no género-tipo Onagra, agora rebatizado com o nome de Oenothera.
Esta família botânica distribui-se por todas as regiões tropicais, subtropicais e temperadas do globo, mas com maior diversidade no continente americano. 
Fuchsia spp.
Muitas espécies são cultivadas como ornamentais como acontece com as espécies dos géneros Oenothera, Clarkia e também Fuchsia, estas últimas especialmente apreciadas e vulgarmente conhecidas por brincos-de-princesa.

Fotos de Epilobium tetragonum subsp. tournefortii: Serra do Calvo/Lourinhã 



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