Alho-dos-campos; Arrebenta-boi; Bigalhó; Candeias;
Erva-da-novidade; Sapintina; Serpentina; Serpentinola; Jairo;
Jaro; Jarreiro; Jarro; Jarro-bravo; Jarro-comum; Jarros-dos-campos
Arum italicum é uma magnífica espécie de origem
europeia que cresce de forma espontânea em bosques e sebes por toda a região
mediterrânica ocidental (mais concretamente sul da Europa, incluindo Ilhas
Britânicas, até ao norte de África), particularmente em locais húmidos ou
sombrios.
Distribuição em Portugal Fonte: Flora Digital de Portugal/UTAD |
Aparentado com o famoso jarro (Zantedeschia aethiopica), planta exótica importada da Africa do sul e que é bastante comum em muitos jardins do nosso país, o Arum italicum não goza, entre nós, da mesma popularidade.
Zantedeschia aethiopica |
Será talvez por
desconhecimento porque em certos países do norte da Europa, como é o caso do
Reino Unido, apreciam-no a ponto de comercializarem os seus rizomas
cultivando-o amorosamente em canteiros de jardim e em vasos.
O interesse por
esta espécie reside na forma e coloração das suas luxuriantes folhas (as quais
se mantêm verdes durante todo o inverno), na forma bizarra das suas
inflorescências e na cor avermelhada dos seus frutos. Esta espécie cresce
particularmente bem e uma vez estabelecida dá origem, em poucos anos, a
colonias alargadas.
A planta reproduz-se
quer por divisão dos rizomas quer por sementes e pode tornar-se invasiva se as
condições lhe forem propícias, sendo difícil de erradicar pois qualquer
pedacinho de rizoma que fique na terra dá inevitavelmente origem a uma nova
planta (o mesmo acontece com o jarro Zantedeschia
aethiopica, típico dos nossos jardins). É também uma espécie muito variável
podendo apresentar folhas de aspeto marmoreado, principalmente na falta de luminosidade.
Quando chega o outono
o Arum italicum produz, diretamente
de um rizoma, um pequeno grupo de grandes folhas sagitadas (em forma de ponta
de seta), verdes e lustrosas as quais estão providas de longos pecíolos de cor
verde claro. As folhas permanecem na planta durante todo o inverno e parte da
primavera após o que ficam meladas e acabam por apodrecer, o que muitas vezes
acontece ainda durante a floração.
As flores de Arum italicum, reunidas numa
inflorescência racemosa (dispostas em torno de um único eixo), surgem em finais
de março ou inícios de abril. Esta é uma espécie monoica em que coexistem
flores masculinas e flores femininas, as quais são desprovidas de perianto
(pétalas ou sépalas).
À primeira vista, a inflorescência de Arum italicum, apesar do seu aspeto peculiar, parece banal. No
entanto a sua estrutura é muito complexa e extremamente especializada. É
essencialmente composta por duas partes: o espadice e a espata.
O espadice é uma
estrutura de eixo cilíndrico, de cor amarelada, espessa e carnuda em cuja parte
inferior se apinham as pequeníssimas flores, dispondo-se em anéis onde flores
férteis e flores estéreis se intercalam. As flores femininas férteis estão
inseridas na parte mais inferior do espadice seguidas de um espaço preenchido
com flores femininas estéreis que se reconhecem por terminarem num apêndice
filiforme. Por cima dispõem-se as flores masculinas férteis e acima destas
existe um novo anel desta vez composto por flores estéreis masculinas,
igualmente providas de apêndices filiformes. A partir daqui o espadice alarga
formando uma espécie de bastão ou clava, de ápice arredondado o qual serve de
chamariz aos polinizadores devido ao odor fétido que exala durante a floração.
A espata é uma bráctea
de grande limbo de forma lanceolada, com a extremidade aguda e ligeiramente
curva, de cor branco-esverdeada ou verde-amarelada; a sua parede interna é
muito lisa e também oleosa devido a secreções das glândulas existentes na
epiderme.
A espata protege o
espadice envolvendo-o completamente até a floração. Nessa altura a espata
abre-se revelando apenas a parte superior do espadice; as flores ficam
escondidas na sua base, numa zona tubular que forma uma espécie de camara
armadilhada para “benefício“ dos polinizadores.
O sistema de polinização
é bastante interessante e sofisticado, contudo dele resulta um elevado gasto de
energias e que tem como consequência a degenerescência precoce de algumas
partes da planta, nomeadamente folhas, espata e parte superior do espadice. É,
no entanto, extremamente eficaz na promoção da polinização cruzada, preservando
a variabilidade genética da espécie e daí o seu sucesso na reprodução de novos
indivíduos saudáveis.
Foto cedida por JARDIN MUNDANI - Veja AQUI |
Quando as flores
femininas ficam maduras a temperatura do espadice aumenta sensivelmente em
relação à temperatura ambiente, podendo chegar a uma diferença de cerca de 6
graus C ou mais, o que representa um gasto tremendo de energia. Este aumento de temperatura ajuda a volatilizar os compostos químicos produzidos pelo espadice acentuando o odor fedorento por ele produzido. Atraídos
pelo seu cheiro favorito (gostos não se discutem…) os insetos polinizadores,
geralmente moscas, tentam poisar nas paredes escorregadias da espata mas acabam
por cair inadvertidamente no interior da camara onde se encontram as flores. Os
apêndices filiformes das flores estéreis deixam passar os insetos mas
impedem-nos de sair pelo que estes permanecem prisioneiros no fundo da camara
onde estão as flores femininas. Debatendo-se para sair os insetos acabam por
espalhar sobre elas o pólen obtido numa outra inflorescência, fecundando-as.
Para reforçar o processo as flores segregam néctar o que persuade os insetos a
deslocarem-se de flor em flor, procurando alimento. Quando as flores femininas
estão fecundadas deixam de produzir o precioso líquido pelo que os insetos se
atropelam procurando a saída, a qual é agora possível pois entretanto os
apêndices filiformes das flores estéreis murcharam. Porém, é a altura de as
flores masculinas férteis ficarem maduras e uma vez que o caminho de saída
inclui passagem obrigatória pelos estames, os insetos saem carregados de pólen
que irão deixar noutra flor, recomeçando o processo de polinização.
Terminada a
polinização, a espata e a parte superior do espadice apodrecem e caiem ficando
apenas as flores femininas que se transformam em frutos, primeiro de cor verde
e depois vermelha, geralmente por alturas de junho.
Todas as partes de Arum italicum contêm compostos químicos
que o tornam potencialmente tóxico, nomeadamente cristais de oxalato de cálcio
(curiosamente os mesmos que formam os cálculos renais); estes componentes
tóxicos podem ser neutralizados se cozinharmos a planta. Se ingerida em cru
causa uma sensação de queimadura na boca e garganta com inchaço e asfixia,
podendo causar a morte. No entanto os casos de intoxicação são raros pois o
gosto amargo dos frutos e outras partes da planta são bastante dissuasores.
Aparentemente até os roedores as acham intragáveis.
O Arum italicum pertence ao género Arum o qual se inclui na família botânica Araceae constituída por cerca de 4000 espécies, muitas delas de
grande impacto no comércio mundial sobretudo nos setores de floricultura e
alimentar. Muitas espécies são cultivadas e usadas em decoração de interiores e
em espaços ajardinados em locais de meia sombra, nomeadamente cultivares dos
géneros Dieffenbachia, Philodendron, Anthurium,
Alocasia, apenas para referir alguns dos mais conhecidos entre nós.
Fotos: Serra do Calvo/Lourinhã (exceto as gentilmente cedidas por Jardin Mundani)