"O grande responsável pela situação de desequilíbrio ambiental que se vive no planeta é o Homem. É o único animal existente à face da Terra capaz de destruir o que a natureza levou milhões de anos a construir"





quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Portulaca oleracea L.

Nomes comuns:
Beldroega; baldroaga; baldroega


Dependendo do ponto de vista, as beldroegas - de nome científico Portulaca oleracea - podem ser apreciadas ou detestadas. É que, apesar de incomodas infestantes são também ervas absolutamente extraordinárias, possuidoras de propriedades medicinais e nutritivas relevantes e que prosperam praticamente em qualquer clima e tipo de solo.
Tal como acontece com muitas plantas silvestres que, em tempos de escassez, já foram alimento complementar das populações rurais - e hoje em dia, tantas vezes desprezadas - as beldroegas têm uma longa história na alimentação humana e no tratamento de diversas enfermidades. Têm sido usadas desde tempos remotos pelas suas propriedades antibacterianas, antiescorbúticas, depurativas, diuréticas e febrífugas, entre outras. Ressurgem na gastronomia contemporânea - ávida de novas texturas e sabores - com o merecido rótulo de alimento muito saudável e de sabor agradável. 

Caules, folhas e sementes são utilizados como ingrediente cru ou cozinhado, em saladas, sopas, pizzas e estufados ou conservadas sob a forma de picles. Têm a vantagem de não ter sabor amargo, ao contrário de muitas ervas silvestres tradicionalmente comestíveis e que vão sendo moda da “nouvelle cuisine” por esse mundo fora. 
As beldroegas caíram em desuso na nossa cozinha tradicional, com algumas exceções, como é o caso do Alentejo ou mais propriamente da região de Évora, onde as beldroegas são confecionadas em ensopado com batatas, pedaços de queijo e ovos, colocados no prato sobre uma bela fatia de pão caseiro. 
Quando cruas as beldroegas têm uma textura firme e o sabor é leve mas com um ligeiro travo a limão com sal e pimenta.

As folhas são mais ricas em ácidos gordos omega 3 do que qualquer outro vegetal verde. Em particular, refiram-se os altos níveis de ácido eicosapentaenóico, habitualmente apenas obtido através da ingestão de peixes como o salmão, a sardinha, ou o arenque, entre outros. Como sabemos, os omega 3 têm efeitos benéficos sobre o sistema imunitário, tensão arterial, níveis de colesterol e até sobre certos distúrbios psicológicos. Para além disso, folhas, caules e sementes contêm diversos minerais, nomeadamente magnésio, cálcio, potássio e ferro e são uma excelente fonte de vitaminas A e C e complexo B, para falar apenas das principais. Os pigmentos vermelhos dos caules e amarelos das flores são também potentes antioxidantes.
Convém, no entanto, saber que apesar de todas as qualidades não convém abusar desta planta na alimentação, na mesma medida em que não é saudável abusar de nenhuma outra. As beldroegas contêm ácido oxálico, uma substância natural que ocorre em variados vegetais, nomeadamente espinafres, morango, uvas, tomate, cacau, chá preto, etc. Quando ingerido em excesso, o ácido oxálico impede a absorção de alguns minerais, como é o caso do cálcio. Aliás, pelo que me é dado verificar, todos os vegetais têm algum elemento antinutricional, razão principal pela qual só temos a ganhar se a nossa dieta for diversificada.

As beldroegas são usadas em todos os continentes pois esta espantosa planta prospera em praticamente todos os tipos de clima e solo. A origem desta planta, hoje em dia presente a nível global, é, de facto, desconhecida. Porém, algumas fontes consideram-na natural do sul da Europa, Norte de África, Índia, Malásia e Australásia, tendo-se naturalizado, na era pré-colombiana, no continente americano. Existem evidências que colocam esta espécie em sedimentos datados de 1430-89, em Crawford Lake, Ontário/Canada, o que sugere a presença da planta no continente americano antes da chegada dos europeus.
Em Portugal está presente praticamente em todo o território, quer no continente, quer nos arquipélagos de Açores e Madeira.

No mercado de Évora as beldroegas são vendidas por bom preço mas atrevo-me a dizer que poucos serão aqueles que, possuindo um pedaço de terra e tendo hábitos regulares de jardinagem ou horticultura, não se tenha já deparado com a Portulaca oleracea. É uma planta rasteira e suculenta de caules avermelhados e pequenas folhas gordas e verdes. A partir de pequeníssimas flores amarelas cada planta produz milhares de sementes desde logo prontinhas a germinar e a produzir mais sementes. O ciclo desta plantinha completa-se em poucas semanas, por isso, se não estiver interessado em a usar na cozinha ou até como cobertura de solo, sugiro que comece a arrancar logo que surjam as pequenas plântulas! As sementes mantém-se viáveis durante cerca de 30 anos.

Portulaca oleracea é muitas vezes cultivada como legume e comercializada como tal. Embora resistente à seca, não se conseguem boas folhas e caules turgidos a não ser que se providencie um solo relativamente húmido e situação soalheira ou de meia sombra.
Na sua forma espontânea Portulaca oleracea cresce preferencialmente nos solos remexidos de hortas, jardins e viveiros; encontramo-la também em ambientes urbanos, medrando corajosamente entre as rachas dos pavimentos e na generalidade dos locais degradados por ação da natureza ou das atividades humanas. É, pois, uma planta essencialmente ruderal, indicadora de solos ricos ridos em nitrogénio. 

Portulaca oleracea é uma espécie anual, herbácea, suculenta e sem pelos. Os talos, com 5 a 30 cm de comprimento são prostrados e crescem, ramificando-se, em redor da raiz formando um tapete arredondado; são carnudos, cilíndricos e a sua coloração varia entre o verde e o vermelho acastanhado.

As folhas são simples, verdes e lustrosas e posicionam-se nos caules de forma alternada ou quase oposta; não tem pecíolo e tal como os caules são bastante carnudas e mostram tendência para se aglomerar em roseta no ápice dos caules.

As pequenas flores, com cerca de 6 mm de diâmetro, são amarelas, sésseis e geralmente solitárias. 

O perianto é constituído por 5 pétalas e 2 sépalas mais curtas e de cor verde. 

As flores estão providas de órgãos de reprodução masculinos e femininos. os numerosos estames amarelos assim como os pistilos, agrupam-se no centro da flor. As flores só abrem em pleno sol e ainda assim, apenas durante algumas horas. Algumas das flores nem sequer abrem pois não chegam a formar pétalas, limitando-se a gerar os órgãos reprodutores. Embora possam ser polinizadas por insetos elas geralmente apressam-se a proceder a autopolinização, a qual lhes permite maior rentabilidade e rapidez na formação das sementes, com um minimo de gasto de energia. Na realidade, as pétalas, cuja função é atrair os polinizadores, representam um grande investimento por parte da planta.
As flores de Portulaca oleracea atraem moscas-das-flores, pequenas abelhas e besouros. Alguns insetos herbívoros predadores usam as suas folhas para alimentar as suas larvas, umas minando o seu interior, outras preferindo a parte exterior (Schizocerella pilicornis e Schizocerella lineata).
Os frutos abrem transversalmente libertando numerosas sementes.
Depois de fecundadas, as flores transformam-se em pequenos frutos do tipo pixídio. São pequenas cápsulas que se abrem ao meio no sentido transversal, libertando as sementes. A parte superior do fruto, semelhante a uma tampa, desprende-se totalmente.

As numerosas sementes são minúsculas e arredondadas, de cor escura e brilhante. São tão leves que facilmente são arrastadas e disseminadas pelo vento. São uma fonte de comida para pardais e outras pequenas aves, as quais também ajudam na dispersão uma vez que as sementes passam pelo trato intestinal sem perderem a viabilidade.

Portulaca oleracea inclui numerosas subespécies distintas as quais se diferenciam pela morfologia das sementes (tamanho, ornamentação e textura). Varias destas subespécies coexistem sem que haja polinização cruzada entre elas, pois são cleistógamas ou seja, possuem um mecanismo de reprodução pelo qual as flores se autopolinizam e se autofecundam antes de abrir, por vezes nem chegando a abrir.
Nesta imagem pode comparar-se o tamanho das sementes de diversas subespécies e respetiva ornamentação da superficie:
1a - Portulaca subspécie oleracea - diâmetro superior a 0,85 mm
  1e - Portulaca subsp. nitida - diâmetro máximo inferior a 0,85 mm
                         1d - Portulaca subsp. granulatostellulata - diâmetro máximo inferior a 0,85 mm
       1b - Portulaca subsp. stellata - diâmetro máximo superior a 0,85 mm
          1c - Portulaca subsp. papillatostellulata - diâmetro superior a 0,85 mm
Fonte: Flora Iberica 
Portulaca oleracea pertence a Portulacaceae, família pequena mas algo complicada e a qual está em processo de reorganização ou mais propriamente “desintegração”, conforme designação de alguns autores. Tradicionalmente esta família inclui cerca de 500 espécies distribuídas por um número de géneros muito variável, consoante o sistema de classificação. Contudo, análises filogenéticas moleculares recentes levadas a cabo por diversos investigadores e as quais foram associadas à observação morfológica das sementes, parecem indicar que a reclassificação se impõe. O sistema de classificação APG (APG IIIdá já como certa uma nova classificação em que Portulaca se torna no único género desta família, com 116 espécies, ficando os outros géneros da classificação tradicional alocados noutras famílias, nomeadamente Montiaceae, Didiereaceae, Anacampserotaceae e Talinaceae.
O género Portulaca inclui plantas herbáceas, suculentas, anuais ou perenes. A maioria das espécies está concentrada em regiões semiáridas das regiões tropicais e subtropicais de África, Ásia e Américas, com alguns poucos representantes nas regiões temperadas da Europa e da Ásia.
Segundo algumas fontes o nome do género Portulaca deriva do latim “portula” que significa pequena porta e se refere ao fruto, o qual se abre através de uma espécie de tampa ou porta.
Portulaca umbraticola
Foto de Forest & Kim Starr - Fonte Wikimedia commons
Algumas espécies de Portulaca têm grande importância no mercado de flores ornamentais. Existem cultivares e híbridos para todos os gostos, preparados para exibirem flores maiores, com maior número de pétalas e floração mais prolongada. As espécies que geralmente vemos à venda em floristas e viveiros do nosso país são, na generalidade, híbridos ou cultivares de Portulaca umbraticola, cujas folhas são semelhantes as da P.oleracea e Portulaca grandiflora com folhas cilíndricas. 
Portulaca grandifloraFoto de Andrew Butko / Wikimedia commons
Tanto P. umbraticola como P.grandiflora são muito vistosas e apresentam flores de diferentes e brilhantes cores no mesmo pé. São plantas anuais, muito versáteis e com ampla aplicação paisagística. São especialmente adequadas para cobertura de solo em jardins de pedra e cestos suspensos, acrescentando cor aos jardins, embora as flores só abram quando o sol está descoberto.

Fotos de Portulaca oleracea: Serra do Calvo/Lourinhã




6 comentários:

  1. Prezada Fernanda,
    Ótimas explicações! Estava tentando separar P. oleracea da P. umbraticola e graças ao teu texto consegui sanar minhas dúvidas. Obrigado

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  2. Parabéns pelo artigo!
    Conteúdo muito bom e de fácil entendimento!
    Conte conosco para informações sobre grama www.agrogramas.com.br/grama-batatais

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