terça-feira, 2 de outubro de 2012

Smilax aspera L.

Salsaparrilha

A Smilax aspera, vulgarmente conhecida por salsaparrilha, é mais uma espécie que sofreu reavaliação (veja aqui -Sobre a classificação cientifica), tendo sido transferida da família das Liliaceae para uma família mais pequena, a Smilacaceae. Esta família inclui cerca de 315 espécies repartidas por 2 géneros, sendo o mais importante o género Smilax ao qual pertence a espécie Smilax aspera. Do género Smilax fazem parte cerca de 300 a 350 espécies, na sua maioria trepadoras com ampla implantação predominantemente em zonas de clima temperado, tropical e subtropical.
Ocorrências em Portugal. Fonte: Flora on
A Smilax aspera distribui-se pelas regiões da bacia do Mediterrâneo incluindo a Península Ibérica, oeste asiático e algumas regiões do noroeste africano.
Não se pode dizer que seja uma espécie muito frequente em Portugal mas é, sem dúvida, uma componente essencial nos matos perenifólios tipicamente mediterrânicos formados por árvores e arbustos de pequena altura em que predominam os Cistus, os Juniperus, Quercus coccifera, Pistacia lentiscus, Daphne gnidium, Phillyrea angustifólia,  Lonicera implexa e Rhamnus alaternos, entre outras.
A Smilax aspera não é esquisita no que diz respeito ao tipo de solo nem é uma espécie particularmente friorenta pelo que podemos encontrá-la em habitats bastante variados. Suporta bem os períodos de seca e embora goste do calor e prefira o sol pleno, tolera alguma sombra. 
A Smilax aspera é uma vigorosa trepadora, perene, áspera e sem pelos; cresce a partir de um rizoma, subterrâneo, geralmente alongado, volumoso e muito ramificado.
Os caules são angulosos e muito longos, podendo chegar aos 15 metros de comprimento; são lenhosos e embora delgados e flexíveis, são muito fortes; estão providos de acúleos (formações rígidas e afiadas semelhantes a espinhos) e ao crescerem enrolam-se em hélice nos troncos e copa de árvores e arbustos, procurando suporte para se elevarem, com a ajuda de gavinhas.
Crescendo sem controlo, os caules da Smilax aspera podem tornar um bosque impenetrável devido ao emaranhado dos seus caules aculeados. Mas nem tudo são desvantagens pois já vi certos arbustos de tal forma manietados pelos caules da Smilax aspera que se tornam abrigo inexpugnável para alguns animais, nomeadamente perdizes e coelhos quando, em épocas de caça, necessitam de refúgio onde os cães não se atrevam a entrar.
As folhas da Smilax aspera demonstram grande plasticidade morfológica podendo apresentar variações no tamanho e na forma e até na quantidade de acúleos. Estas variações têm a ver com o local onde crescem os espécimes, dependendo da exposição aos ventos e à radiação solar. As folhas dos indivíduos que crescem em locais mais abrigados são geralmente cordiformes (formato ovado-triangular, lembrando um coração), enquanto em locais mais desabrigados ou sujeitos a pastoreio, as folhas tendem progressivamente a ser mais estreitas e alongadas (sagitadas, ou seja, em forma de seta).
De resto, as folhas são pecioladas e posicionam-se de forma alterna nos caules; são inteiras, com acúleos na margem e ocasionalmente apresentam manchas brancas; a sua consistência coriácea ajuda a planta a poupar as suas reservas de água e nutrientes através da redução da transpiração.
As folhas estão munidas de duas estípulas que crescem a partir dos nós e que se transformaram em gavinhas bastante longas e enroladas. O limbo das folhas apresentam 5 ou 7 veios principais, mais ou menos paralelos, que se unem no ápice e estão ligados entre si por uma rede de veios secundários.
A Smilax aspera é uma espécie dioica pois produz apenas flores unissexuadas, sistema em que as flores femininas e as masculinas se desenvolvem em indivíduos diferentes.
As flores, muito perfumadas aparecem no fim do verão e implantam-se na axila das folhas e na extremidade dos caules; são minúsculas, com 6 tépalas livres e agrupam-se em cachos de 5 a 30 flores unissexuais de cor branca, com laivos rosados.

As flores masculinas apresentam 6 estames livres e proeminentes, com anteras esbranquiçadas.

As flores femininas têm ovário dividido em 3 compartimentos com 3 estigmas sesseis.

Os frutos são bagas carnudas e arredondadas, inicialmente avermelhadas e depois negras, na maturação. No seu interior encontram-se de 1 a 3 sementes pequenas e arredondadas, lisas ou ligeiramente rugosas. Estas bagas são uma importante fonte de alimento para as aves.
A raiz da Smilax aspera tem sido usada em medicina tradicional e remédios caseiros por alegadamente possuir propriedades sudoríferas, depurativas e diuréticas.
Em meados do seculo passado a raiz desta planta foi muito utilizada como ingrediente de uma bebida não alcoólica chamada salsaparilha (precursora da CocaCola) e que foi muito popular em Portugal e Espanha, a par do xarope de groselha e do capilé.

Os nomes comuns atribuídos à espécie Smilax aspera são muito variados:
Alagacão; alagação; alegação; alegra-campo; alegra-cão; legação;
recama; salsaparrilha; salsaparrilha-bastarda; salsaparrilha-brava;
salsaparrilha-do-reino; salsaparrilha-indigena; salsaparrilha-indígena;
salsaparrilha-rugosa; silvamar



Sobre as espécies:
homoicas, monoicas, dioicas ou polígamas

Cerca de 70% das angiospérmicas (grupo de plantas que produzem flores e que constituem o maior grupo de plantas terrestres) produz flores homóicas, ou seja, as suas flores são autossuficientes pois estão providas de órgãos reprodutores funcionais tanto femininos como masculinos. Há quem lhes chame flores perfeitas, completas ou hermafroditas.

Mas, há espécies que produzem apenas flores unissexuadas, ou seja, flores exclusivamente femininas ou masculinas as quais podem crescer na mesma planta ou em plantas separadas. Quando flores femininas e masculinas se desenvolvem na mesma planta, esta diz-se monoica; as plantas que geram flores masculinas ou femininas, em indivíduos separados, chamam-se dioicas.

A maioria das plantas é homoica, porque a natureza se organizou de modo a não desperdiçar energia. Este é, sem dúvida, o sistema mais eficiente e rentável visto que todas as flores da mesma planta são férteis e produtoras de semente.

Nas plantas monoicas e dioicas, mais raras na natureza, o gasto de energia é maior uma vez que tanto flores masculinas como femininas representam um gasto de energia mas apenas as femininas darão origem a sementes. Estes sistemas são característicos de plantas nativas das regiões desérticas e dos trópicos e ao que se sabe terão evoluído a partir de plantas primitivamente homoicas. O que levou as plantas a evoluir neste sentido não está ainda bem esclarecido, no entanto tem sido interpretado como forma de adaptação às condições do meio ambiente para, por um lado aumentar a variabilidade genética e por outro, reduzir os riscos de extinção das espécies causada pela autopolinização.

Mais raras ainda são as espécies polígamas que usam sistemas combinados e bastante complexos, em que flores hermafroditas podem coexistir com flores masculinas e/ou com flores femininas, apenas para dar um exemplo. Na realidade as combinações possíveis são múltiplas e comprovam o esforço na adaptação das plantas ao meio que as rodeia, para desta forma rentabilizar ao máximo os recursos, reduzindo os custos energéticos.

A natureza é inteligente, tendo feito as adaptações necessárias no sentido de produzir mais, com menores meios e apostando na diversidade. Que exemplo para todos nós, as aulas sobre a eficiência das plantas deviam ser obrigatórias!

Também é incrível pensar que, adaptações que levaram milhões de anos a serem aperfeiçoadas, poderão ser agora de certo modo escusadas, num mundo global em que tantas espécies foram transportadas para habitats diferentes dos seus de origem. Credivelmente as plantas continuarão a adaptar-se aos novos habitats, numa permanente procura da perfeição. Como serão, daqui a milhões de anos, espécies que hoje nos são tão familiares? Isto é, se tiver sobrado algum do mundo vegetal, tal como o conhecemos...

Fotos: Arribas do Caniçal / Lourinhã


8 comentários:

  1. Obrigado, Fernanda, por mais esta lição. Saudações.

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  2. Olá Fernanda
    Desconhecia o seu blogue. Vou passar a "seguir". Será bem vinda ao BioTerra, ecoactivo há mais de 8 anos! Ecoabraços resistentes como a Smilax aspera.

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  3. Olá João,
    Obrigada pela visita, volte sempre.
    Fiquei a conhecer o Bioterra, parabens pelo empenho. Todos não somos demais para tentar mudar as mentalidades, na luta pela preservação dos ecossistemas.
    Saudações ecológicas

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Já me tenho socorrido de, pelo menos, um dos seus blogs para identificar algumas plantas. Há uma planta que conheço desde miúdo mas não consigo identificá-la de modo convincente, parece uma Ephedra, mas duvido que seja. Talvez você consiga dar-me uma ajuda que desde já agradeço. O endereço da fotografia é o seguinte:
    https://plus.google.com/photos/101712631127092984542/albums/5732778550386769233/5732780240981263058
    Saudações ecológicas!

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    1. Olá Alex,
      Enviou-me varias fotos de conteudo diferente mas penso que se esteja a referir à planta de flor amarela...
      Infelizmente não consigo distinguir pormenores suficientes atraves das fotos para poder dar uma ajuda. Sugiro que consulte o portal da Flora on cujo link lhe envio http://www.flora-on.pt/ e onde pode fazer pesquisa na base das carateristicas da espécie em questão. Espero que ajude. Saudações ecológicas.

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  6. Blog bem feito e completo; ajudou-me no chamado "cuspo de cuco" pois temia que fosse prejudicial para minhas "sardinheiras". Nunca houve em meu jardim em Cascais ,mas este ano parece que virou "praga".Já agora gostava de saber para que serve a "cigarrinha espumosa": será que é útil para alguma coisa ?
    Muito obrigada

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    1. Para: A Casa de Santos Dumont em Petrópolis
      Bom dia,
      Se encontrou "cuspo de cuco" nas suas sardinheiras aconselho a que o retire o mais depressa possível antes que as ninfas saiam e por sua vez se reproduzam. Quando adulto este inseto chupa a seiva das plantas. Curiosamente este ano também tive "cuspo do cuco" em algumas plantas do meu jardim, possivelmente estamos num ano mais propicio à proliferação do inseto. No meu caso, eu retirei todas as espuminhas cortando os raminhos onde estavam instalados e quando não foi possível retirei com a mão, protegendo os dedos com um lenço de papel. Depois queimei na lareira.
      Um abraço
      Fernanda

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