segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Ruscus aculeatus L.

Nomes comuns:
Erva dos vasculhos; gilbarbeira; gilberbeira; pica-rato; 
sazevinho-menor; azevinho dos pobres

O Ruscus aculeatus é uma espécie perene. As ramificações que surgem desde a base formam um arbusto compacto e de forma arredondada, com cerca de 20 a 100 cm de altura.
Os caules, eretos, brotam a partir de um rizoma, ou seja um caule subterrâneo que se desenvolve na posição horizontal em relação ao solo e a partir do qual se formam, não só as raízes mas também as gemas que irão dar origem a novos indivíduos.
Fazendo parte da família das Asparageceae, o Ruscus aculeatus foi incluído no género Ruscus o qual integra umas 7 espécies de arbustos perenifólios nativos de algumas ilhas atlânticas europeias e da região mediterrânica.
Ocorrências em Portugal - Fonte: Flora on
Podemos encontra-lo em quase todos os tipos de solo mas mostra preferência por locais secos e férteis, em situações de sol ou alguma sombra, por vezes debaixo de arvores, nomeadamente em soutos ou montados; é também comum em matos tipicamente mediterrânicos formados por espécies de baixa altura, de folhas sempre verdes, pequenas e coriáceas; aclimata-se bem aos ventos marítimos, podendo por isso encontrar-se em arribas costeiras; suporta bem alguns períodos de seca mas em contrapartida é muito sensível ao frio.
Exemplar queimado pelo frio, apesar de se encontrar ao pé do mar onde não se registam geadas
Sendo que esta espécie vive em condições de secura, é interessante notar certas adaptações morfológicas e fisiológicas que lhe permitem a utilização da água e nutrientes de forma eficiente. Assim, de forma característica, este pequeno arbusto quase não apresenta folhas as quais foram gradualmente diminuindo de tamanho no decurso da evolução da planta, como meio de poupar água.
 As folhas foram substituídas por ramos de caules modificados, i.e. expansões de forma oval que são designados por cladódios e têm a aparência de folhas. Os cladódios, devido à sua textura coriácea resultam numa economia de água uma vez que reduzem consideravelmente a evaporação. Os cladódios, rígidos e terminando num acúleo (ponta curta, rígida e afiada), apresentam cor verde tal como os caules normais, devido à presença de clorofila. Curiosamente todas as partes da planta estão especialmente adaptados para poderem fazer a fotossíntese e as respetivas trocas gasosas.
Foto: Andrea Moro
Dipartimento di Scienze della Vita, Università di Trieste
As flores, muito pequenas, crescem isoladas no centro dos cladódios e apresentam órgãos reprodutores em sistema de separação de sexos, isto é, existem plantas com flores masculinas e plantas com flores femininas (flores dioicas). À primeira vista flores femininas e masculinas são semelhantes, apresentando o perianto (conjunto de cálice e corola) em forma de estrela com 6 peças florais livres e desiguais, de cor violácea ou esverdeada; as flores femininas têm um pistilo muito curto e o estigma esférico; as masculinas têm 3 estames, com anteras amarelas, cujos filetes estão soldados a todo o comprimento formando um tubo inserido na base da flor. 
Foto: WIKIPEDIA
As flores férteis dão origem ao fruto, uma baga globosa, inicialmente verde e depois vermelho vivo na maturação, contendo 1 ou 2 sementes volumosas e de cor amarelada. Estes frutos são a parte mais apelativa da planta e fazem as delícias de aves e de alguns pequenos mamíferos que ajudam a disseminar as sementes, através dos dejetos.

A planta propaga-se não só através das sementes mas também, por via vegetativa, a partir do rizoma.


O Ruscus aculeatus floresce e frutifica durante o inverno. As fotos com os frutos maduros incluidas neste "post" referem-se ao mês de fevereiro.



Há quem coma os rebentos jovens do Ruscus aculeatus, crus ou cozinhados, como se fossem espargos com os quais, aliás, estão aparentados pois pertencem à mesma família. Em contrapartida há que ter cuidado para não ingerir os frutos que são tóxicos, podendo ter efeito purgante, especialmente perigoso para as crianças.

Ruscus aculeatus possui grande número de propriedades medicinais sendo muito utilizado em fitoterapia como anti-inflamatório, vasoconstritor e diurético, especialmente eficaz no tratamento das hemorroidas.

O nome vernáculo erva-dos-vasculhos, que entre outros se dá ao Ruscus aculeatus, tem a ver com o facto de em tempos menos prósperos se terem utilizado os seus ramos como vassouras, principalmente nas aldeias, por serem rígidos, ásperos e muito duráveis.
Contudo, a colheita do todo ou parte do Ruscus aculeatus que cresça de forma espontânea nos nossos campos está muito restringida a nível europeu. Tal como o Ilex aquifolium (azevinho), o Ruscus aculeatus é muito procurado como planta ornamental para jardins e também como elemento decorativo em arranjos de flores. Assim, devido às colheitas excessivas estas espécies encontram-se em risco fazendo, por essa razão, parte da lista de espécies protegidas no âmbito da Directiva-Habitat-Fauna-Flora, 1992.


Sobre a classificação científica...

Nos tempos que correm a espécie Ruscus aculeatus está incluída na família das Asparagaceae. De notar que esta planta foi alvo de recente reclassificação tendo feito parte da família das Lilaceae e também da família das Ruscaceae, em sistemas de classificação anteriores.
Pode dizer-se que tem havido alguma falta de consenso entre os taxonomistas acerca da família ou do género a que determinada planta deve pertencer.
A classificação científica moderna ainda assenta as suas bases no sistema do biólogo sueco Lineu do seculo XVIII que agrupou as plantas de acordo com as suas semelhanças morfológicas, conceito que provou ser demasiado limitado tendo em conta a diversificação das espécies. Desde então, muitas espécies foram reclassificadas de acordo com novos conceitos sobretudo baseados no princípio de Darwin que agrupa as espécies com base na evolução a partir de um ancestral comum, dando menor importância às características morfológicas partilhadas. Inevitavelmente estas reclassificações, que aliás nem sempre foram consensuais, fomentaram alguma confusão devido à discrepância que se pode encontrar em diferentes manuais da especialidade. Felizmente muita coisa poderá mudar com a recente evolução da sistemática molecular. Através do acesso a toda a informação hereditária das espécies pela descodificação do ADN certamente será possível chegar a um consenso alargado e instituir um sistema de classificação que não suscite dúvidas. Assim, é expectável que no futuro muitas mais revisões na classificação das espécies sejam aprovadas por quem de direito. É também de prever que, tendo em conta a quantidade de espécies em causa este possa ser um processo complicado e moroso, pelo que teremos de conviver com informações díspares e navegar em algumas incertezas durante bastante mais tempo…


Fotos: Arribas do Caniçal / Lourinhã



7 comentários:

  1. Embora já conhecesse esta planta e a tenha mostrado aos meus alunos das licenciaturas de Agronomia e de Arquitetura Paisagista da Universidade de Trás os Montes e Alto Douro (Vila Real) estas fotos são extremamente elucidativas, quer a nível botânico,écofisiológico, quer aina a nível ornamental, as quais me vão ser muito úteis porque as aulas dos meus alunos nem sempre coincidem com s floração e frutificação desta espécie. Uma curiosidade adicional às informações aqui dadas: o nome vulgar dado aqui na UTAD a esta espécie é Azevinho dos pobres. Bem hajas Fernanda Delgado por teres partilhado estas fotos e informações escritas,

    José Pedro Araújo-Alves

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    1. José Pedro,
      Obrigada pelo seu amável comentário e informação adicional.Fico muito feliz por ter sido útil.

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  2. Quero saber se tem como plantar essa linda folhagem através do seu caule, pois ela estava em um arranjo na igreja ,achei bonita e interessante a folha resolvi trazer três galhos,coloquei na água já observei, que atrás das folhas estão nascendo pequenos brotinhos que não sei se é a flor ou broto,gostaria se possível me informar se tem como plantar os caules,desde já agradeço pela resposta Zulmira.

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    1. Olá Zulmira,
      Muitos arbustos podem ser reproduzido através dos caules. Geralmente eu coloco as estacas na terra, embora nunca o tenha experimentado com esta espécie. No entanto se os seus caules são jovens e ainda estão herbáceos é muito possível que consiga alguma coisa dentro de água. Nada como experimentar. De qualquer forma a ideia é que a estaca crie raízes em primeiro lugar. Sem raízes nada vinga. Se os seus caules estão brotando é melhor retirar, seja lá o que for que esteja a brotar caso contrario os caules não terão energia para criar raízes. Aliás, flor não é concerteza pois pode ver no texto o tipo de flor que esta planta dá. Poderá ser algum caule mas se puder elimine-o para dar chances às raízes.

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  3. Eu peguei duas hastes em um arranjo e coloquei na água .
    Ela vem se conservando a vários meses.
    Esperava que produzisse raiz.
    Não aconteceu!
    Coloquei algumas folhinha na terra e para minha surpresa , uma das folhinha criou raiz.
    Eu já havia lido sua matéria.
    Mesmo assim insisti na tentativa de fazer muda.
    Espero que minha plantinha evolua.

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