segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Em defesa da biodiversidade – Parte 3

As plantas exóticas invasoras

A Oxalis pes-caprae forma densos tapetes verdes pontilhados de flores amarelas que florescem no final do inverno. O efeito é de grande beleza mas é uma grande invasora, provocando sérios prejuízos na agricultura. Foi trazida para Portugal e região mediterrânica no século XVIII. Saiba mais AQUI.

 AQUI foram feitas referências às plantas exóticas, assim designadas por não serem nativas do habitat onde se encontram, tendo sido transportadas para fora da sua área natural de forma intencional ou acidental.  O transporte de espécies para regiões diferentes, resultante de ação humana, remonta ao tempo das migrações dos povos na Antiguidade, tendo sido realizada de forma lenta e gradual. Porém, nos últimos três séculos este processo foi acelerado, a ponto de se tornar alarmante. Sem dúvida que muitas das plantas já introduzidas têm interesse económico como espécies ornamentais, agrícolas ou florestais mas, é preciso não esquecer que muitas trouxeram graves problemas ambientais e económicos que só se revelaram posteriormente.
Eichhornia crassipes é uma planta aquática originaria da Bacia do Amazonas. Foi introduzida em Portugal com intuitos ornamentais mas tornou-se invasora, formando densos "tapetes" à superfície da água reduzindo a luz e o oxigénio. Pode encontrar-se em lagoas, braços de barragens, troços de rios e ribeiros.
Foto de H.Zell - Wikimedia Commons
Em Portugal prosperam plantas exóticas originárias do todo o Mundo, seja de climas temperados, subtropicais ou tropicais graças ao nosso clima ameno e acolhedor. As famílias mais representadas são as Poaceae (família das gramíneas), as Asteraceae (família dos malmequeres), Fabaceae (família das leguminosas) e as Polygonaceae.


Acacia longifolia. Foto de Josh Jackson/ Wikimedia Commons
As exóticas espécies do género Acacia, conhecidas vulgarmente por mimosas, são um grave problema biológico e económico do nosso país. São originárias do sudoeste da Austrália e África do Sul e foram importadas com fins ornamentais e para estabilização de areias, taludes e encostas. Expandiram-se de forma avassaladora invadindo as zonas costeiras e margens de rios, afetando o crescimento de outras plantas através da alteração da disponibilidade de azoto no solo em seu proveito, em detrimento de outras espécies. Tem elevada capacidade de produção de sementes as quais permanecem viáveis por várias décadas e cuja germinação é estimulada pelos fogos. A sua erradicação é muito difícil e onerosa pois as suas raízes formam enormes touças debaixo da terra que, não só o fogo não consegue destruir, como rebenta de novo se os ramos forem destruídos. Uma das espécies mais agressivas é a Acacia longifolia e os métodos de controlo até agora utilizados foram ineficazes pelo que, finalmente, foi autorizada a libertação de um agente de controlo natural (inseto) para conter a dispersão desta espécie.
Saiba mais AQUI.
De modo geral, as espécies exóticas causam impactos no equilíbrio das plantas nativas pois apresentam vantagens competitivas, no pressuposto de que as populações introduzidas são menos afetadas por inimigos naturais, do que eram no seu habitat natural. Apesar disso, muitas são as espécies exóticas que subsistem ao longo dos anos de forma equilibrada, de tal forma que certos autores defendem que, do ponto de vista estritamente biológico, as plantas exóticas não são um problema e que devem ser vistas como parte integrante dos sistemas naturais. Outras espécies, em contrapartida, revelam um comportamento invasor logo após a sua introdução num novo território, multiplicando-se de forma descontrolada. Há ainda as espécies que, estando aparentemente controladas, de repente se tornam invasoras. Tal acontece quando o equilíbrio ecologicamente precário em que vivem se quebra, devido a uma súbita alteração nas condições ecológicas. São diversos os fatores que estimulam o rápido aumento da sua distribuição, desencadeando essa invasão biológica, entre elas a ocorrência de catástrofes naturais, alterações climáticas, os incêndios e a consequente abertura de clareiras.

A cana-comum, Arundo donax, é uma gramínea rizomatosa oriunda do leste europeu e Ásia temperada e tropical. Em Portugal distribui-se por todo o território, sendo muito comum perto de linhas de água e outras zonas húmidas. É muito utilizada pelos agricultores para delimitar as zonas agrícolas, protegendo-as do vento, especialmente nas áreas costeiras. É muito difícil de erradicar pois qualquer pequeno rizoma dá origem a novas plantas.

Um dos maiores problemas das plantas exóticas é que só se toma consciência da sua invasibilidade quando já estão estabelecidas e o mal está feito. Este é um problema que se regista a nível mundial e em Portugal não somos exceção. A lista negra de espécies exóticas invasoras referenciadas no nosso país é bastante extensa e as consequências da sua presença são irreversíveis pois uma vez instaladas são praticamente impossíveis de erradicar, sendo a sua contenção dispendiosa e presumivelmente ineficaz. Muitas destas espécies foram introduzidas no país em épocas passadas em que se desconheciam as implicações inerentes; destinavam-se à utilização das madeiras, estabilização de taludes, fixação das areias ou com fins ornamentais. É de salientar que muitas invasoras vieram sem ser convidadas, tendo as suas sementes sido transportadas por acidente, dada a facilidade crescente das viagens e transportes internacionais. Contudo, a importação indiscriminada de plantas exóticas - especialmente com fins ornamentais - continua até hoje, sendo que muitas delas rapidamente se instalam na natureza e reproduzem sem controlo.
Ailanthus altissima, árvore de grande porte e vulgarmente conhecida por espanta-lobos ou árvore-do-céu, foi introduzida em Portugal no século XVIII a partir da China, de onde é oriunda. Pode encontrar-se em espaços urbanos e nas margens das estradas e é uma vigorosa invasora devido ao seu crescimento extremamente rápido e grande produção de sementes que, arrastadas pelo vento, germinam facilmente e em todos os tipos de solo.

Eis algumas das características que potenciam o poder invasivo das plantas exóticas:
- crescimento rápido e boa adaptação a diferentes condições ambientais;
- elevada capacidade reprodutora, produzindo muitas sementes as quais são viáveis por longos períodos de tempo e cuja germinação pode ser estimulada pelos fogos;
- boa capacidade de dispersão e colonização, ajudadas pelo facto de estarem livres dos inimigos naturais que as controlavam no seu local de origem;
- aptidão para reprodução vegetativa através de estolhos ou rizomas;
- maior capacidade competitiva que as espécies nativas pelos recursos disponíveis.

Os impactos das invasoras refletem-se de forma negativa no meio ambiente, afetando plantas autóctones, fauna, solo e recursos hídricos, através de:
- alteração das cadeias alimentares;
- uniformização dos ecossistemas devido à extinção de espécies autóctones, desequilíbrio dos ecossistemas e diminuição da biodiversidade;
- diminuição da disponibilidade de água no caso de plantas mais exigentes no seu consumo;
- alteração dos regimes de fogo;
- alteração da disponibilidade de nutrientes com a alteração dos ciclos do carbono e do azoto e do pH do solo. 

A Cortaderia selloana, vulgarmente chamada penachos ou erva-das-pampas, veio da América do sul. É uma gramínea de grande porte, rizomatosa e que é muito apreciada pelos seus penachos brancos. Tem crescimento vigoroso e as suas densas rosetas basais abafam o coberto vegetal autóctone. Nem sequer servem de alimento ou abrigo à fauna pois as suas folhas tem margens serrilhadas e cortantes. Os penachos produzem elevada quantidade de sementes as quais se espalham com o vento e germinam com grande eficácia. Nos últimos anos todos temos sido testemunhas da crescente expansão desta planta e a este ritmo receio bem que não fique palmo de terra por colonizar. A zona de Torres Vedras tem sido especialmente afetada mas não se veem medidas que ponham travão a esta expansão, antes pelo contrário, a expansão continua e todos os meses vemos novos exemplares. Esta planta forma rapidamente uma enorme touça que é resistente ao corte, ao fogo e aos químicos. 

Em Portugal o assunto em causa é regulado pelo Decreto-Lei n.º 565/99 o qual pretende condicionar a introdução na Natureza de espécies de fauna e flora não indígenas, com excepção das destinadas à exploração agrícola e onde se pode ler:
É proibida a disseminação ou libertação na Natureza de espécimes de espécies não indígenas, ainda que sem vontade deliberada de provocar uma introdução na Natureza, como forma de prevenir o estabelecimento acidental de populações selvagens” e também “A introdução de espécies não indígenas na Natureza pode originar situações de predação ou competição com espécies nativas, a transmissão de agentes patogénicos ou de parasitas e afetar seriamente a diversidade biológica, as atividades económicas ou a saúde pública, com prejuízos irreversíveis e de difícil contabilização.”
Nos anexos I, II e III este decreto lista, respetivamente, as espécies de fauna e flora introduzidas em Portugal (com destaque para as invasoras), as espécies arbóreas com interesse e as espécies não indígenas de fauna e flora que comportam risco ecológico reconhecido.
Contudo, a maior dificuldade em fazer cumprir a legislação reside no desconhecimento das populações que, inconscientes das consequências dos seus atos, contribuem para a proliferação das invasoras. Para se poderem adotar legislações mais restritivas, será necessário informar o público em geral acerca das possíveis consequências de uma introdução indesejada. Há um grande “desconhecimento acerca dos riscos associados à introdução de espécies não indígenas e a educação é uma importante estratégia de prevenção, uma vez que a participação do público é crucial para controlar e prevenir as invasões biológicas”. Muitos nunca ouviram falar de plantas invasoras nem fazem a mínima ideia do problema que podem criar ao plantar no seu jardim uma planta exótica ou, quando cansados dela, a despejam num monte de entulho. Assim, há que apostar na prevenção através da educação e informação do público pois cada um de nós pode e deve dar o seu contributo através de comportamentos responsáveis.
Em estudos realizados por Colton & Alpert  em 1998, verificou-se que, “mesmo em cidadãos com elevado nível de formação académica, apenas uma minoria apoia a aplicação de um esforço considerável para controlar as plantas invasoras”.
Carpobrotus edulis, o vulgarmente denominado chorão, é uma bela planta rastejante originária da África do Sul. Foi introduzida em Portugal para fixar os areais costeiros mas provou ser uma péssima ideia pois o seu desenvolvimento vigoroso resulta em vastos tapetes que abafam e mata as plantas nativas, substituindo-se a elas. Saiba mais AQUI.

Problemáticas são também certas espécies ornamentais que são deitadas no lixo e que desta forma se podem assilvestrar. Esta foto é do fruto e sementes de uma Datura stramonium, planta muito bonita mas venenosa, oriunda da América do sul tropical. Estas sementes poderão permanecer viáveis durante mais de 40 anos, dando origem a novas plantas logo que surjam as condições ideias para germinar. Encontrei a planta já em frutificação meio enterrada num monte de entulho que os vizinhos do fim da rua resolveram descartar após as obras lá de casa. Para além de invasora, as sementes produzidas são muito abundantes altamente venenosas, podendo ser letais se ingeridas. Ainda há bem poucos meses surgiu uma noticia nos meios de comunicação social portugueses sobre uma criança que comeu as sementes e foi hospitalizada, embora eu não tenha tido conhecimento do desfecho. Veja mais fotos da planta AQUI.
Hydrangea macrophylla, vulgarmente conhecida por hortênsia ou novelos, é uma espécie invasora nativa da China e do Japão. Foi introduzida como planta ornamental em todas as regiões temperadas e subtropicais do mundo, sendo uma das espécies mais cultivadas em jardins e da qual existem múltiplos cultivares. Em Portugal continental é muito popular em jardins mas raramente se encontra estabelecida em estado silvestre. Em contrapartida, tornou-se num ícone turístico nos arquipélagos dos Açores e Madeira onde foi plantada ao longo das estradas, tendo-se naturalizado. Aos poucos foi invadindo as linhas de água, as turfeiras e as florestas naturais. Devido à sua constante expansão está a ser uma ameaça à sobrevivência das espécies nativas.  
As espécies aqui mencionadas são apenas alguns exemplos de invasoras que podem ser vistas em muitos jardins públicos ou privados. O tópico "invasoras" também não fica aqui esgotado. Este é um assunto algo extenso e sobretudo muito complicado. Do que não há dúvida é que devemos apostar na prevenção pois resolver os problemas que nos colocam as invasoras é quase impossível e fica caro. Para tal, é preciso esclarecer devidamente as populações. Por outro lado, na impossibilidade de prever o grau de invasibilidade das plantas exóticas, devemos investir mais nas plantas autóctones, usando-as para repovoar as áreas degradadas antes que sejam ocupadas por espécies problemáticas.

NOTA:
No âmbito deste blogue foi dado enfoque à flora exótica mas, é de notar que há organismos invasores em todos os grupos de seres vivos, desde a fauna aos microrganismos (vírus e bactérias).


4 comentários:

  1. Parabéns pelo teu blog.
    Só para dizer que uma vez assisti ao desaparecimento duma enorme touça de Cortaderia selloana.
    Um casal amigo fez um espaço com um lago para gansos e patos e os gansos deram conta da planta toda, não voltou a rebentar.

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    1. Olá Filipe
      Obrigada pelo comentário. Esse foi um remédio fantástico, pratico e ecológico...

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