Nomes comuns:
Endro; aneto; funcho-bastardo; anega
Endro; aneto; funcho-bastardo; anega
Anethum
graveolens é uma planta aromática muito apreciada e amplamente consumida no mundo
inteiro mas principalmente na India, Egito e outros países mediterrânicos e
também na Europa central e Escandinávia. Em Portugal é mais conhecida pelo nome
vulgar de endro e em muitos países do mundo por dill. É uma espécie de origem asiática (Asia ocidental e India) que
se assilvestrou e naturalizou em diversas regiões da Europa, presumivelmente introduzida
durante a ocupação dos romanos.
Como consequência da colheita indiscriminada repetida ao longo de séculos, esta
espécie está praticamente extinta como planta silvestre. No entanto é extensamente
cultivada, quer em jardins e pequenas hortas, quer em grandes plantações cujo
objetivo é a comercialização. Felizmente pode ainda ser encontrada, na sua forma
espontânea, em alguns locais da Itália e da Península
Ibérica. Em Portugal encontra-se por aqui e por ali, crescendo em campos
cultivados, vinhas, milharais e beira dos caminhos.
À primeira vista a espécie Anethum
graveolens pode ser confundida com o funcho, Foeniculum officinale,
espécie mais conhecida entre nós, no entanto
a semelhança é apenas aparente. Pertencem ambas à mesma família botânica mas o aroma
e sabor são inteiramente diversos e, para além de outras características morfológicas que as
diferenciam, o endro é uma espécie de ciclo anual enquanto que o funcho é
perene, podendo durar 10 anos ou mais.
Anethum graveolens forma um pequeno arbusto que pode
chegar a 1 metro ou mais de altura, dependendo das condições que encontra. É
bastante atrativo e fica lindíssimo em qualquer jardim tendo a vantagem, para
si próprio e para as outras espécies vizinhas, de atrair muitos insetos que
chegam em busca de pólen e néctar.
Alguns deles são polinizadores,
abelhas, vespas, borboletas, visitantes de vai e vem. Outros, moscas-das-flores
(sirfídeos) e besouros (coleópteros), nem
sempre polinizam mas em contrapartida são agentes de controlo biológico natural
de pragas pois são espécies predadoras (geralmente na fase larvar) de afídeos,
pulgões, tripes e outras pragas que parasitam e sugam a seiva das plantas.
Sirfídeos e coleópteros parecem encontrar na Anethum graveolens um sítio de
abrigo com boas condições para o acasalamento, com recursos alimentares quer
para adultos (pólen e néctar) quer para as larvas.
Os caules finos, de
seção cilíndrica, são ramificados na parte superior; são eretos mas, com o
peso das umbelas, acabam por descair em direção ao solo; a superfície é de coloração
verde azulada, sem pelos, e apresenta-se coberta de estrias longitudinais.
No seu interior os caules são ocos, porém preenchidos com uma abundante medula branca.
As folhas inserem-se nas axilas dos nós, de forma
alternada mostrando bainhas abertas e de forma cónica que abraçam os caules.
O contorno do limbo das folhas é triangular ou em forma
de losango mas é muitissimo recortado, subdividindo-se 3 ou 4 vezes, resultando em múltiplos segmentos filiformes.
As minúsculas flores, de cor amarela, são muito numerosas
e reúnem-se em grandes inflorescências arredondadas semelhantes a um conjunto
de pequenos guarda chuvas abertos. Esta é a característica mais evidente da
família botânica Apiaceae (também designada Umbelliferae) a que pertence a
espécie Anethum graveolens. A estas inflorescências dá-se o nome de umbelas,
origem do nome Umbelliferae
originalmente dado a esta família. As flores têm pedicelos de comprimentos
diferentes o que lhes permite ficarem todas à mesma altura. Nesta espécie a
inflorescência é composta por varias umbélulas, ou seja umbelas mais pequenas.
Numa
umbela o extremo do pedúnculo dilata-se formando um recetáculo no qual se
insere um número variável de pedicelos, chamados raios, geralmente de tamanhos
aproximados. No caso particular da Anethum graveolens o tamanho dos raios é
algo desigual.
As
pequenas flores são hermafroditas pois possuem órgãos de reprodução de ambos os
sexos. Fenecem rapidamente, começando por perder as pequenas corolas assim como
os estames, pois nesta espécie a maturação das estruturas masculinas (estames)
precede a maturação das estruturas femininas (estigmas e estiletes). A corola é
constituída por 5 pétalas minúsculas, arredondadas, entalhadas no topo e dobradas
para trás. As brácteas e as bractéolas estão ausentes nesta espécie. As sépalas
estão reduzidas a 5 pequenos dentes situados no topo do ovário. Os estames são
5, de cor amarela. A parte superior do
pistilo é formada por dois estilos livres com ápices divergentes os quais
engrossam na base formando uma protuberância cónica onde se deposita o néctar e
a qual persiste durante a frutificação.
A planta floresce e frutifica de junho a setembro.
Os frutos, produzidos em
grande quantidade, são compostos por duas partes as quais se abrem durante a
maturidade deixando sair as sementes.
Os frutos são ovais, achatados e
apresentam três nervuras longitudinais proeminentes e duas expansões laterais
semelhantes a asas que ajudam na dispersão pelo vento
Anethum graveolens pertence à família Apiaceae ou Umbelliferae (ambos os nomes são admitidos), uma importante família botânica que engloba entre 2500
a 3700 espécies divididas entre 300 a 450 géneros, alguns deles de
classificação duvidosa e seguramente sujeitos a revisão. Anethum graveolens
está incluída no género Anethum, um pequeníssimo género de apenas 4 espécies mas
esteve, durante algum tempo, incluída no género Peucedanum.
O sabor do endro é diferente do funcho ou de qualquer outra aromática, algo entre o amargo e o agradavelmente picante, com um travo muito ténue de anis. O aroma é muito intenso e característico. Folhas e sementes têm sabores ligeiramente diferentes mas são igualmente apreciadas.
As folhas devem ser utilizadas frescas, acabadas de colher ou congeladas pois perdem muito do seu sabor quando secas. Pela mesma razão devem ser adicionadas no final da cozedura ou ser usadas em cru. Pelo contrário as sementes inteiras devem ser incorporadas no início da cozedura pois levam algum tempo a libertar o seu sabor.
O endro é usado para dar sabor a sopas, guisados, massas, ovos, molhos, carnes grelhadas e pratos de peixe. Por exemplo, na Escandinávia o endro é ingrediente essencial no tempero do salmão.
Podem juntar-se as sementes a bolos e ao pão e são também muito usadas na aromatização de pickles aos quais dão um sabor muito característico. As próprias folhas e flores podem ser usadas como pickles.
As sementes podem ser reduzidas a pó ou ser consumidas inteiras.
O óleo essencial que se obtém através da compressão das folhas é de qualidade inferior ao que se retira das sementes, sendo este de qualidade excelente, de odor muito característico mas agradável. O óleo essencial das folhas é utilizado na indústria dos licores enquanto que o óleo das sementes é utilizado como matéria-prima na confeção de sabonetes, detergentes, cremes, perfumes e loções.
O endro é um repelente natural das traças pelo que se podem aproveitar as flores secas colocando-as dentro de saquinhos para perfumar e desinfetar armários e gavetas. Moscas e melgas também não gostam do seu cheiro.
Mas as qualidades do endro/Anethum graveolens não ficam por aqui, pois são muitas as propriedades terapêuticas que o levam a ser utilizado como remédio caseiro, para debelar uma quase interminável variedade de afeções. É especialmente eficaz para acalmar cólicas intestinais em bebés, estimula a digestão, cura enjoos, flatulência, azia, insónia, dispepsia, dores de dentes, infeções dos rins, infeções uterinas, problemas oculares, etc.
O endro é também ótimo para clarear a pele e fortalecer as unhas mas uma das qualidades que a tornaram mais preciosa nos tempos da Antiguidade era o de eliminar o mau hálito, uma patologia com implicações afetivas, sociais e até religiosas. Em certas culturas o mau hálito era considerado motivo valido para dissolução do casamento, daí a importância do endro e outras aromáticas em épocas tão remotas. As sementes do endro eram mastigadas ou misturadas com vinho e murta.
Os tratamentos passam pelas infusões das folhas ou das sementes e, desde que não haja exagero na sua ingestão não parece haver problemas de toxicidade. Contudo, convém não iniciar qualquer tratamento sem o conselho adequado para prevenir alguma possível contraindicação. O manuseamento persistente da planta pode causar dermatites e aumentar a sensibilidade da pele às radiações solares.
Anethum graveolens é uma espécie fácil de cultivar, quer no solo ou num vaso, de preferência num local abrigado mas não muito quente. Não suporta transplantes pelo que deve ser semeada no local definitivo. As sementes devem ser colocadas à superfície, (apenas cobertas com uma fina camada de terra) pois necessitam de claridade para germinar. A planta cresce rapidamente pois é de ciclo anual, podendo as sementes ser colhidas cerca de 3 ou 4 meses após a sementeira.
Usos e costumes:
Há milhares de anos que o endro (Anethum graveolens) é utilizado em culinária
e em medicina popular. Já era usado pelos antigos egípcios há cerca de 5.000 anos, em
xaropes para a tosse e alívio das dores de cabeça. Usavam-na também nos
processos de mumificação e na preparação de unguentos e perfumes.
Foi muito
popular entre os gregos que queimavam o óleo extraído das sementes para perfumar o ambiente das suas
casas, o que era considerado a maior das extravagâncias mesmo para os mais
ricos, tendo em conta o alto preço desta planta. Os gregos também misturavam as
folhas do endro no vinho para lhe incrementar o sabor e curavam as
feridas dos soldados colocando as sementes sobre elas.
Esta pratica foi seguida pelos romanos que também juntavam a planta à
alimentação dos gladiadores na crença de que isso aumentaria a sua força física.
Para o povo hebreu o valor comercial desta
planta era enorme. O seu consumo foi sujeito a um imposto cobrado pelos
romanos, durante a ocupação da Palestina e o dízimo, imposto religioso, era
pago com uma porção de endro, entre outras especiarias. Atestando a sua
importância existem referências a esta planta no Talmude e também na Bíblia, mais concretamente no
Evangelho segundo São Mateus 23, 23:
"Ai de vocês, mestres da lei e fariseus,
hipócritas! Vocês dão o dízimo da hortelã, do endro e do cominho, mas têm
negligenciado os preceitos mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia e
a fidelidade. Vocês devem praticar estas coisas, sem omitir aquelas.”
Reza ainda a Historia que Carlos Magno servia as
sementes nos banquetes aos seus convidados como meio de sanar os soluços resultantes
dos excessos no consumo de vinho e comida.
Na Idade Média a planta foi muito
usada, sendo uma das plantas favoritas tanto para fazer feitiços de cariz
amoroso como na proteção contra a bruxaria.
Durante o século XVII era usada com
o objetivo de conservar uma boa saúde física e mental e também tinha fama de
afrodisíaca.
Durante os séculos XVII e XVIII, em Inglaterra, as sementes eram
consumidas durante os longos serviços religiosos proporcionando algum conforto
a adultos e crianças.
No século seguinte as sementes chegaram a ser usadas como
coadjuvantes nas dietas de emagrecimento.
Hoje em dia o endro é um dos
ingredientes característicos da cozinha tradicional de muitos países europeus
especificamente em toda a Escandinávia, Rússia, Holanda, Polónia, Bulgária, Alemanha, Grécia e Turquia. Na India e Paquistão
as sementes são especialmente valorizadas como digestivas e geralmente servidas
no final das refeições, embora a espécie mais cultivada seja a Anethum sowa, cujas sementes são maiores.
Em Portugal o endro é
pouco conhecido, não sendo muito utilizado na nossa cozinha tradicional, talvez
porque são tantas as aromáticas que temos à disposição. A única exceção que
conheço é a Sopa do Espírito Santo, prato típico da ilha de Santa Maria, nos
Açores.