terça-feira, 30 de agosto de 2011

Cirsium vulgare (Savi) Ten. Syn: Cirsium lanceolatum (L.) Scop, non Hill, Cirsium lanceolatum prol. Linki (Nyman) Samp., Cirsium linkii Nyman

Cardo-roxo


O Cirsium vulgare é uma espécie que pertence à família das Asteraceae/Compositae e ao género Cirsium (ver aqui). Distribui-se por grande parte da Europa, algumas regiões da Ásia e também pelas montanhas do Atlas, no noroeste africano. Foi introduzida noutras paragens, nomeadamente na Austrália e continente americano, onde prolifera e é temida como erva daninha e invasora.

O Cirsium vulgare é uma planta herbácea, bianual, muito vulgar em Portugal e que se destaca pelas suas vistosas cabeças florais. No seu todo, é grande e vigorosa, podendo atingir os 2 m de altura. Espalha-se rapidamente, formando densas colónias e dificultando o desenvolvimento de outras espécies.


A raiz principal é profunda e carnosa.
Esta espécie forma uma roseta de folhas basais no primeiro ano do seu ciclo vegetativo e é apenas no segundo ano que surgem as hastes florais.

O caule principal é ereto, geralmente ramificado na metade superior, estriado, quase lenhoso e alado em todo o seu comprimento ou seja, apresenta uma expansão lateral ao longo do caule, em forma de folha e provida de espinhos.

Os caules estão cobertos por um indumento de pelos muito finos, macios e flexíveis, ligeiramente entrecruzados.


As folhas são fortemente espinhosas, e profundamente lobadas, com o segmento final em forma de espada. As folhas basais não têm pecíolo definido e as caulinares, dispostas de forma alternada, crescem com a base do limbo a prolongar-se ao longo do caule. A página inferior das folhas é áspera ou coberta de pelos brancos.




As flores, todas em forma de tubo estreito e de cor rosa-arroxeado, reúnem-se em grandes capítulos florais, solitários ou em cachos de 2 ou 3, no extremo dos caules.


O invólucro de brácteas tem forma quase esférica e possui pelos longos, finos e macios, dispostos esparsamente. As brácteas que compõem o invólucro são imbricadas, isto é, estão sobrepostas tal como as telhas de um telhado e terminam com um espinho.


As flores de Cirsium vulgare são muito ricas em néctar pelo que são visitadas por numerosos insetos polinizadores, entre os quais abelhas e borboletas.
Nesta região o Cirsium vulgare floresce e frutifica de maio a agosto.


Os frutos são cipselas de forma cónica encimadas por um papilho de pelos ramificados e plumosos que ajuda na dispersão pelo vento, sendo levados a grandes distâncias. Também podem ser levados pela água da chuva e pelas formigas.

Podemos encontrar o Cirsium vulgare em terrenos incultos, beiras de caminho e terrenos degradados.


É uma planta comestível. Podem comer-se as folhas basilares durante o primeiro ano de crescimento, em saladas ou cozinhadas, desde que se lhe retirem os espinhos. Também a raiz, enquanto tenra, pode ser comida crua ou cozinhada. Os rebentos jovens podem ser comidos como se fossem aipo ou cozinhados como espargos, durante o início do segundo ano da planta.


Tal como a maioria das plantas silvestres, o Cirsium vulgare tem sido utilizada em medicina caseira devido às suas propriedades medicinais, sendo especialmente indicado em problemas gástricos, indigestão e problemas respiratórios. Tempos houve em que esta planta era utilizada como remédio para todos os males, reais e imaginários, pelo que muitas vezes é apelidado de Cardo-santo.
Mais uma vez gostaria de referir que todas as plantas medicinais devem ser consumidas com muita precaução e em doses moderadas pois quase todas as espécies têm algum grau de toxicidade.
Fotos: Arribas da Praia do Caniçal/Lourinhã





terça-feira, 23 de agosto de 2011

Eryngium maritimum L

Cardo-marítimo


Eryngium maritimum é uma espécie nativa do continente europeu. É relativamente abundante nas zonas costeiras de Portugal, vivendo na primeira linha dos sistemas dunares, onde as areias são mais instáveis. Pode, no entanto, ser também observada em locais mais recuados, onde as areias estão mais estabilizadas.

Esta planta, com características semelhantes aos cardos (ver aqui), desenvolveu inúmeras adaptações às condições agrestes do seu habitat, em que a proximidade do mar origina amplitudes térmicas que vão do sol escaldante ao frio cortante, luminosidade excessiva, ventos fortes carregados de partículas de sal, escassez de nutrientes e reduzida disponibilidade de água.

Nesta conformidade, o profundo e forte sistema radicular do Erygium maritimum permite-lhe sobreviver soterrado na areia enquanto as suas folhas espinhosas e coriáceas, cobertas por uma camada cerosa, evitam as perdas de água.
O Eryngium maritimum é uma planta herbácea, perene, de aspeto robusto mas relativamente baixa, desenvolvendo-se a partir de uma roseta basal. Os caules, estriados e por vezes com algumas manchas avermelhadas, são ascendentes e ramificados. As folhas, de margens denteado-espinhosas como as do azevinho, estão cobertas por uma cobertura cerosa que lhe dá a característica cor verde-água ou cinzento-azulado e as protege da desidratação e dos efeitos erosivos da areia.

As folhas basais, em forma de leque, têm pecíolo enquanto as caulinares são sésseis (sem pecíolo) e envolvem parcialmente o caule. As nervuras das folhas são bastante nítidas e têm cor esbranquiçada, tal como as margens.


As flores, de cor azul-vivo, são minúsculas e encontram-se agrupadas em capítulos, formando cabeças florais compactas e globosas, muito atrativas para as abelhas e outros insetos.


Cada pequena flor.  que constitui uma cabeça floral, é rodeada por um cálice composto por 5 sépalas estreitas e eretas, maiores que as pétalas.

As cabeças florais estão rodeadas de brácteas largas e espinhosas que se assemelham às folhas.



 Eryngium maritimum floresce e frutifica de maio a setembro. Os frutos são escamosos, oblongos e estão providos de pelos em forma de gancho.

O Eryngium maritimum pertence à família botânica das Umbeliferae/ Apiaceae e ao género Eryngyum o qual inclui cerca de 230 espécies, nativas de prados ou áreas rochosas e costeiras. Muitas das espécies são usadas como plantas ornamentais em jardins, tirando partido da sua folhagem e inflorescências, de cores muito decorativas. É de notar que as plantas deste género não apresentam as inflorescências carateristicas da família das Umbeliferae/ Apiaceae (ver aqui). Isto é, em vez de inflorescências do tipo umbela, semelhantes a um guarda-chuva, as espécies Eryngium apresentam as flores reunidas em capítulos oblongos ou semi-esféricos.
Muitas espécies do género Eryngium são comestíveis além de que, pelas suas reconhecidas propriedades medicinais, têm sido utilizadas desde tempos imemoriais como diurético e anti-inflamatório. Em qualquer dos casos devem ser consumidas com muita precaução e em doses moderadas pois algumas espécies são tóxicas.
Especificamente, o Eryngium maritimum é utilizado na composição de cremes e tratamento de rejuvenescimento da pele o que pode vir a ter como consequência um aumento na procura e recolha de exemplares desta espécie. A planta pode ser cultivada mas parece que perde qualidades, daí a preferência pelas espécies silvestres.
Em alguns países europeus, nomeadamente Reino Unido, Escócia, Espanha e Alemanha esta espécie passou a ter o estatuto de espécie protegida pois já se nota um preocupante enfraquecimento das colónias em certas zonas costeiras e por vezes o seu total desaparecimento. Outra das razões para que tal aconteça prende-se com o facto de as plantas crescerem relativamente perto do mar, justamente no lugar que muitos banhistas preferem para tomar banhos de sol e consequentemente poderem ser danificadas pelas máquinas que limpam as areias das praias. Nesta competição por um pedaço de areia, temo que o Eryngium maritimum não saia a ganhar...

Em Portugal, o Eryngium maritimum continua a ser uma espécie relativamente abundante, não se encontrando ameaçada, pelo que não usufrui de qualquer estatuto de conservação. Apesar disso esta espécie deve ser valorizada e protegida tendo em conta a sua importância na estabilização das dunas frontais ao mar.

Fotos: Praia da Areia Branca - Areal Sul/Lourinhã



sábado, 13 de agosto de 2011

Cynara humilis L.

Alcachofra...

“Alcachofra” é o nome genérico pelo qual são popularmente conhecidas as cerca de 10 espécies que fazem parte do género Cynara, incluído na grande família das Asteraceae/Compositae. Estas espécies são nativas da região mediterrânica e noroeste de África e têm em comum algumas características, das quais destaco as seguintes:
• São plantas herbáceas de caules eretos.
• Têm folhas de segmentos espinhosos.
• As flores, de cor azul-violeta ou brancas, são todas tubulosas e estão reunidas em grandes e globosos capítulos solitários.


O “post” de hoje é dedicado à espécie Cynara humilis, uma das espécies mais abundantes do género Cynara em Portugal, encontrando-se distribuída pelo centro e sul do país, particularmente em solos áridos de natureza basáltica e calcária.


Esta planta é comumente conhecida como alcachofra-branca, alcachofra-de-são-João ou alcachofra-brava e é uma herbácea perene e espinhosa, com raízes profundas. É mais uma bela espécie estreitamente relacionada com o amplo grupo dos genericamente chamados cardos.


Também têm muito que ver com certas tradições populares, rituais alegres que  espero continuem a ser celebrados. Enfim, lembro-me de quando era menina e saltava a fogueira no bairro da Ajuda onde eu vivia em Lisboa, nas noites dos Santos Populares se queimava a flor de uma alcachofra para saber se o(a) nosso(a) namorado(a) gostava de nós. O resultado positivo do teste implicava que a alcachofra voltasse a florir na manhã seguinte, por isso usavamos o truque de lhe dar apenas uma chamuscadela. Eu e os meus amigos e amigas teriamos apenas uns 10 anos ou pouco mais e desde então já passaram algumas décadas mas estou certa que nenhum de nós esqueceu esses bons momentos de verdadeira infância e camaradagem.

 Cynara humilis floresce e frutifica de maio a agosto. A parte aérea da planta seca durante o resto do verão.


As folhas da roseta basal que vão dar vida à planta da estação seguinte renascem ao nível do solo durante o final do inverno e primavera.



É desta roseta de folhas basais que, até ao mês de maio, emerge um caule curto com folhas semelhantes às basilares que termina numa inflorescência do tipo capítulo, composta por flores de cor azul-violeta. Existem também exemplares de flores brancas mas são raros.


Tanto as folhas basilares como as caulinares são formadas por segmentos finos, rígidos, com a nervura central bem marcada terminando num espinho. As folhas são verde-lustrosas na página superior e cobertas por pelos espessos, curtos e esbranquiçados na página inferior.



Os capítulos aparecem geralmente solitários e são grandes e vistosos. As inúmeras e diminutas flores que se reúnem densamente no recetáculo do capítulo formam um tubo oco, estreito e comprido. As flores da periferia são portadoras de estames, sendo portanto funcionalmente masculinas. As flores internas possuem órgãos funcionais masculinos e femininos.
O invólucro que protege o conjunto das flores é globoso ou ovoide e apresenta brácteas involucrais que terminam com um espinho de ponta curta, aguda e rígida. Ao amadurecer, o invólucro de brácteas adquire um belo tom arroxeado.


Os frutos são cipselas de cor acastanhada, com a forma de um prisma de 4 lados e providos de um tufo de sedas chamado papilho que facilita a dispersão pelo vento e que acaba por cair com o passar do tempo. Estes frutos são muito apreciados pelas aves.



A Cynara humilis é uma espécie silvestre comestível, sendo os capítulos carnosos a parte mais apreciada. Estes devem ser colhidos antes de aparecerem as flores, enquanto as brácteas do invólucro ainda estão tenras. As partes comestíveis da alcachofra são estas brácteas, que apresentam uma base carnuda e o receptaculo também carnudo, no qual estão inseridas. Podem ser consumidas cozidas, estufadas ou mesmo assadas.


As alcachofras são vegetais muito nutritivos e de baixas calorias que desde há séculos são utilizadas na medicina tradicional devido as suas propriedades terapêuticas, principalmente como agente antidiarreico, depurativo e diurético. São indicadas no tratamento da arteriosclerose, celulite, colesterol, diabetes, fígado e gota.


Embora no nosso país se encontrem nas ervanárias em forma de chá ou xarope, as alcachofras estão pouco difundidas nos hábitos culinários dos portugueses, sendo no entanto o seu cultivo bastante comum em Espanha, França e Itália.
Nestes países as alcachofras que se encontram à venda no comércio não são as silvestres mas sim variedades cultivadas, da espécie semelhante Cynara scolymus cujas folhas e invólucro de brácteas não têm espinhos. Estas variedades têm sido aperfeiçoadas para perder os espinhos, ao longo de muitos e muitos anos de cultivo.

Sobre as alcachofras e os queijos:

Algumas espécies de Cynara contêm enzimas (quimosina) nas pétalas das flores que atuam como coagulante natural na elaboração de queijos. As flores da Cynara humilis e de uma espécie semelhante, a Cynara cardunculus, são vulgarmente designadas como “flores de cardo” e têm sido utilizadas como “coalho” no fabrico artesanal de queijos. Este foi, por tradição e ao longo de várias centenas de anos, o coalho mais utilizado nos territórios mediterrânicos. Infelizmente já só se emprega em algumas explorações caseiras. Em Portugal temos como exemplo os queijos de ovelha de Serpa, Serra da Estrela e Azeitão. Para preparar as ervas para o coalho, retiram-se as flores tubulares do capítulo de qualquer uma destas espécies quando elas começam a abrir e deixam-se secar. Ao juntar algumas destas flores, depois de secas, ao leite destinado ao fabrico de queijo obtém-se a coagulação do leite em que a sua parte sólida (coalhada) se separa do soro.

A atividade coagulante dos extratos das flores destas espécies é devida à presença de proteinases aspárticas.
O leite também pode ser coalhado através da adição de outras substâncias vegetais como por exemplo o vinagre ou o sumo de limão, folha de figueira ou certas sementes mas hoje em dia o processo vegetal de coagulação das proteínas do leite raramente é utilizado nas explorações industriais.

E também: 

Não só a titulo de curiosidade mas também para complementar este assunto, não posso deixar de informar que para além do processo vegetal existem mais formas de obter o coalho:

·        Animal: neste caso a quimosina é obtida a partir do revestimento do estômago de mamíferos ruminantes recém nascidos (bezerro, ovelha, cabrito). Este é o processo mais utilizado mas é contestado não só pelas comunidades vegetarianas mas também pelas organizações ambientalistas, na generalidade. Porcos podem também ser utilizados neste processo, assim como animais adultos, que resultam mais baratos mas em que a quimosina obtida é de menor eficácia.

·        Genético: resulta da manipulação genética de alguns microrganismos nomeadamente bactérias nos quais foi introduzido o DNA necessário para a produção de quimosina.

·    Microbiano: a quimosina é obtida a partir de certos fungos.

Os processos genético e microbiano parecem mais adequados para a dieta vegetariana no entanto a utilização destes processos tem sido questionada por entidades reguladoras da indústria dos laticínios, em certos países. Ao mesmo tempo continuam os estudos sobre as proteinases aspárticas vegetais que propiciam a atividade coagulante dos extratos das flores, sendo que os estudos sobre a Cynara humilis são escassos. Na realidade a investigação tem incidido principalmente sobre a Cynara cardunculus pois é ponto assente que esta variedade é mais completa em conteúdo enzimático.


Fotos de Cynara humilis: Serra do Calvo e arribas da Praia do Caniçal- Lourinhã