Nomes
comuns:
Alfavaca;
alfavaca-da-cobra; alfavaca-de-cova; amarras; cobrinha; columbrina; erva-das-muralhas;
erva-das-paredes; erva-de-Nossa-Senhora; erva-de-Santa-Ana; erva-de-Santana;
erva-do-amorra; erva-dos-muros; erva-fura-paredes; fava-da-cova; helxina;
parietária; pulitaina; pulitária; urtiga-mansa.
Faz
agora precisamente um ano que partilhei com vocês alguns factos sobre as nossas amigas urtigas, com
especial enfoque na espécie Urtica membranacea. Agora, é a vez de darmos especial atenção a outra espécie da mesma família (Urticacaeae),
a Parietaria judaica. A principal e óbvia diferença entre estas duas espécies que,
embora da mesma família pertencem a géneros diferentes, reside no facto de
Parietaria judaica não ser agressiva ao toque por falta de pelos urticantes.
Como erva
medicinal Parietaria judaica já teve o seu momento de glória. As suas folhas
eram usadas em chá para problemas de estômago e intestinos, inflamações da
bexiga, patologias hepáticas e renais entre outras. Também tem efeito
diurético. O seu uso mais conhecido tem a ver com o tratamento de hemorróidas,
em banhos de assento, usando a água do cozimento das folhas. Há quem ainda a
use, muitas vezes associada com as malvas e outras ervas.
Alerta:
Os tratamentos
continuados com ervas medicinais sejam elas quais forem, não devem ser
conjugados com a toma de medicamentos pois podem interferir com a ação destes. Podem
duplicar a ação dos medicamentos, impedir a sua absorção ou até impossibilitar
a eliminação dos mesmos pelo organismo no tempo programado. Os acidentes mais
graves têm sido registados em casos de intervenção cirúrgica pois podem
bloquear a ação dos anestésicos ou o tempo de coagulação do sangue. Veja mais
AQUI.
As folhas são comestíveis, quer cruas, quer cozinhadas e não só são uma boa fonte de fibras como são também ricas em minerais (fosforo, ferro e cálcio) e vitaminas A, B1, B2, B3 e C. O sabor das folhas cruas lembra o do pepino mas se cozinhadas tornam-se mais suaves, permitindo que haja uma boa ligação com o sabor de outros alimentos. Apesar de fibrosos, os caules também são comestíveis.
Parietaria judaica é também uma planta bastante apreciada por certos tipos de borboletas cujas larvas se alimentam das suas folhas, como é o caso da Vanessa atalanta.
Vanessa atalanta: vulgarmente conhecida como red admiral ou Almirante vermelho europeu é bastante frequente em Portugal podendo ser observada em todo o país. Veja mais informações AQUI. Foto de Didier Descouens / Fonte: Wikimedia Commons |
Apesar das
suas qualidades como erva medicinal, alguns de nós precisamos de ter cuidado
com a Parietaria judaica. Os seus pequeníssimos grãos de pólen são muito
abundantes e voláteis, além de persistirem longamente no ar que respiramos,
provocando agravamento nos sintomas de asma e rinites alérgicas de quem é mais
sensível ao pólen desta planta.
A planta floresce de março a outubro e por vezes durante o ano inteiro, se o inverno for suave. Este longo período de florescimento e a alta produção de flores são atributos associados às plantas de habitats perturbados e portanto são características esperadas numa espécie ruderal como é o caso de Parietaria judaica.
No âmbito das
chamadas ervas “daninhas” as Parietaria (género com 10 espécies das quais 3 existem Portugal) parecem ser as que motivam mais alergias. Contudo, são as gramíneas a principal fonte deste mal que atinge quase um terço
da população. Também existem árvores cujo pólen nos pode causar alergia como é
o caso da oliveira, dos eucaliptos ou dos carvalhos, apesar das suas flores
serem tão pequenas que mal damos por elas. São precisamente os grãos de pólen
mais pequenos que causam as maiores alergias; eles andam em suspensão no ar mas
não os vemos. O seu efeito maléfico é potenciado nas cidades devido às
partículas da poluição que alteram a sua configuração e os tornam mais
agressivos.
Os caules estão cobertos de pelos densos |
A página superior das folhas está coberta de pelos |
Pagina inferior das folhas |
As pétalas e sépalas coloridas ou
perfumadas que vemos nas flores de tantas outras espécies não são produzidas em
benefício da beleza mas sim porque precisam de atrair insetos polinizadores.
Esses “artifícios” de que se socorrem para completar o seu ciclo reprodutivo com sucesso custam caro e são um encargo enorme em termos de energia. Ora, a Parietaria
judaica prescindiu dos atavios e evoluiu no sentido de não ficar dependente dos
insetos, adaptando-se à polinização pelo vento.
Estames de Parietaria judaica com as anteras brancas em evidência. Foto de Hectonichus. Fonte Wikimedia Commons. |
O androceu, ou seja a parte masculina das flores hermafroditas consiste
em 4 estames que, enquanto a flor permanece fechada não têm altura suficiente
pelo que são obrigados a ficar curvados dentro dela, em tensão. A emissão de
pólen para a atmosfera ocorre quando a flor abre e os elásticos filamentos dos
estames se endireitam bruscamente.
O ovário, quer nas flores hermafroditas quer nas femininas, é superior e
consiste num único carpelo do qual emerge um estilete com um estigma cujo ápice
é formado por vários pelos, ficando semelhante a um pincel.
As flores femininas são as primeiras a
amadurecer e só depois amadurecem as flores hermafroditas. No entanto as flores
hermafroditas desta espécie são protogínicas, ou seja, os
seus órgãos masculinos só amadurecem depois dos femininos terem cumprido a sua
parte e deixarem de estar recetivos. Desta forma a planta consegue evitar a autopolinização, apesar de que existem indícios de que tal é possível, uma vez que parece
existir autocompatibilidade.
A ântese
(período em que a flor está aberta) começa nas inflorescências basais e
processa-se de forma gradual até chegar às flores na parte superior dos caules
o que permite que os caules continuem a crescer e a formar mais
inflorescências. Este padrão de crescimento possibilita, simultaneamente, o crescimento vegetativo e reprodutivo. Esta é mais uma estratégia que permite o alastramento da espécie.
Após a maturação
os periantos das flores bissexuais secam e caiem, ficando debaixo da planta-mãe
o que pode resultar num grande banco de sementes naquele pedaço de solo. No
entanto, em solos duros e impermeáveis, estes periantos secos, ainda envolvendo as
sementes, podem ser arrastados pelas chuvas e ventos fortes.
Por sua vez, os periantos secos das
flores femininas e respetivas sementes ficam agarrados às brácteas do invólucro, formando uma estrutura que pode ajudar na dispersão pelo vento
ou a flutuar na água.
Os pelos que cobrem os periantos e o invólucro de brácteas são uma ajuda
extra na dispersão das sementes ao agarrarem-se ao pelo dos animais ou à roupa
e calçado dos passeantes.
Os frutos são pequenos, ovais e brilhantes, de cor escura.
Fruto de Parietaria judaica ao centro, à esquerda brácteas do invólucro e à direita o perianto da flor. Foto de Leo Michels (Usage:Public Domain). |
Muitas
vezes Parietaria judaica é confundida com a sua congénere Parietaria
officinalis que é muito semelhante mas que não cresce na Península Ibérica.
Segundo a Flora Iberica a P. judaica distingue-se de P. officinalis por ser uma
erva prostrada ou ascendente com folhas até 5 a 7 cm de comprimento e com
perianto tubular até 3 ou 3,5 mm na frutificação. Por seu lado, P. officinalis é uma planta
ereta,com folhas até 12 cm de comprimento e com perianto acampanulado até 2,75
ou 3 mm na frutificação.
Parietaria officinalis Foto de Franz Xaver. Fonte: Wikimedia Commons |
Parietaria
judaica pertence ao género Parietaria um dos cerca de 50 da família Urticaceae,
uma das grandes famílias botânicas englobando com mais de 2000 espécies largamente
distribuídas pelas regiões tropicais, menos comum nas zonas temperadas, registando-se a maior concentração de géneros e espécies na Ásia tropical. As espécies
desta família apresentam uma notável variedade morfológica. Sob o ponto de
vista taxonómico é uma família difícil, parcialmente devido ao facto de muitos
dos carateres de diagnóstico necessitarem de ser observadas ao microscópio para
que haja uma identificação precisa, devido ao seu tamanho diminuto. Por outro
lado, muitas espécies foram originalmente classificadas com base apenas em
semelhanças morfológicas o que nem sempre comprova a relação entre as espécies tendo-se registado alguns casos de homoplasias, ou seja, as características
morfológicas semelhantes são coincidência, tendo surgido independentemente, não
representando proximidade genética. Assim, à semelhança do que acontece com
tantas outras famílias, Urticaceae tem sofrido bastantes alterações em resultado de análises filogenéticas as
quais permitem estabelecer a relação evolutiva das espécies e determinar a
importância relativa dos traços morfológicos para a classificação cientifica.